Antônio Bezerra Baltar


foto: Hugo Segawa

Antônio Bezerra Baltar | 1915 - 2003

Faleceu em Recife no dia 15 de junho de 2003 o engenheiro Antônio Bezerra Baltar.

Nascido no Recife e formado na Escola de Engenharia em 1938, ainda estudante trabalhou no Departamento de Arquitetura e Urbanismo - DAU, sob a liderança de Luiz Nunes, uma das iniciativas pioneiras na arquitetura moderna brasileira dos anos 1930.

Dedicou boa parte de sua atividade profissional ao urbanismo. Sua tese para o concurso de provimento da Cadeira de Urbanismo e Arquitetura Paisagística, Diretrizes de um Plano Regional para a Cidade do Recife, apresentada em 1951 para a Escola de Belas Artes da Universidade do Recife, tornou-se uma referência na área. Trabalhou e foi influenciado pelo padre Louis-Joseph Lebret, do Movimento de Economia e Humanismo, tendo coordenado pesquisas para o SAGMACS e desenvolvido planos urbanos para cidades nordestinas. Partindo para o exílio em 1965 com o golpe militar, trabalhou na ONU e no CEPAL, tendo retornado ao Brasil somente em 1980.

Antônio Baltar participou de uma mesa de depoimentos organizado em 1997 no 2º Seminário DOCOMOMO Brasil (ao lado de Carmen Portinho e Walter Gordilho). Em sua fala ele recordou vários episódios de sua vida, inclusive um fato pouco conhecido: o de que ele ciceroneou Philip Goodwin e Daniel Kidder-Smith quando eles vieram ao Brasil para a preparação do livro Brazil Builds. Este depoimento se encontra registrado num vídeo produzido por Angela West Pedrão, para o DOCOMOMO Brasil e UFBA.


Os três mosqueteiros

Poderia chamá-los de os três mosqueteiros da arquitetura e do urbanismo modernos em Pernambuco: Ayrton Carvalho, Antonio Bezerra Baltar e Pelópidas Silveira.

Foram os primeiros, desde a década de 40 do século XX, a defender o modernismo na arquitetura e no urbanismo. Três engenheiros com senso do bem público, casos cada vez mais raros. Três engenheiros amigos entre si e que se conduziram como se tivessem feito um pacto secreto üü o de defender, sem alardes, mas com firmeza, a cultura arquitetônica e urbanística em Pernambuco.

Um deles, Antonio Bezerra Baltar, nos deixou recentemente. Sendo engenheiro, escreveu vários artigos sobre a arquitetura e o urbanismo modernos e sobre o nosso patrimônio histórico no Boletim da cidade e do porto do Recife; é dele, também, um dos melhores trabalhos publicados sobre a breve e profícua estada do arquiteto Luiz Nunes em Pernambuco. Sua tese de concurso para a então chamada Universidade do Recife, em 1951, versava sobre um plano regional para o Recife e é o primeiro documento que aponta para a necessidade de considerar o planejamento do crescimento do Recife contemplando os municípios limítrofes, em outras palavras, o planejamento do desenvolvimento de uma região metropolitana, como viria a ocorrer vinte anos depois.

Como professor da cadeira de urbanismo no curso de arquitetura da Escola de Belas Artes, depois transformado em Faculdade de Arquitetura da Universidade do Recife, Baltar fez a cabeça de muitos arquitetos e ganhou deles respeito e admiração, por unanimidade.

Tive o privilégio de ser aluno dos três mosqueteiros e guardo, especificamente do professor Baltar, uma lembrança à qual sempre me apego. Como estudante subversivo fui preso em 1964 pelo Exército Brasileiro e fui libertado 48 dias depois. Livre, tive de voltar a um quartel do Exército para responder a mais um interrogatório. No exato momento em que eu entrava no hall do quartel defrontei-me com o professor Baltar que estava saindo do seu interrogatório. Ao me ver, Baltar fez menção de vir ao meu encontro, no que foi impedido, energicamente, pelas mãos dos militares que o acompanhavam.

Mas ele é meu aluno! Disse Baltar, como se isso, que significava tanto para ele, sensibilizasse os ouvidos dos militares. Fomos mais afastados ainda, olhando um para o outro e não posso esquecer a expressão de angústia e solidariedade que Baltar me dirigiu. A imagem desse olhar jamais se apagou de minha memória. Muito obrigado, professor Baltar, um brasileiro antigo como dizia Darcy Ribeiro, por tudo o que significastes para mim, pois pensavas o mundo justo, como escreveu e te dedicou João Cabral de Melo Neto, num poema intitulado O engenheiro.

Recife, 20 de junho de 2003

Geraldo Gomes da Silva, arquiteto.